Na Era da falta de assunto, uma boa mentira demora para ir dormir. Faz uns cinco, seis anos, que desisti de buscar informação com conselheiro de velha guarda: todos maquiam a realidade, preenchem o que esquecem com algum desejo romântico, não conseguem enxergar do que fazem parte. Os poucos "de dentro" com quem falo são parte dos muitos que se constrangem com a convivência compulsória com esta fauna que, voltando, não é inofensiva, e não é só por obra e mérito de Mustafá Contursi.



Se eu gosto do "palmeirismo", aquela ideia de que um clube de colônia italiana deve ser gerido com "sangue italiano", uma cachoeira de estereótipos à mesa, a "famiglia" brigando entre si e depois comendo pizza para fazer as pazes? Em um romance, adoro. O mundo real é diferente. Vivo nele, ainda que não goste da maioria das coisas com que tenho de lidar. A relação doentia com o dinheiro e o consumo, por exemplo. Não toco minha vida como uma cantina italiana de 1914 por isso. Controlo todos os meus gastos. Espero o mesmo do Palmeiras, claro, e fico duplamente frustrado quando uma gestão profissionalizada do futebol não dá certo. Os fantasmas palmeirenses são espiritualizados, possuem até mantras, "nunca dirás bom e barato" é um deles, mas vamos lá, dá para apertar uma gestão como a de Mattos sem que isso pareça o desejo por uma gestão, escolha você algum Palaia ou algum Gianinni, "daquelas".



Digo isso porque os atuais assinam também pelo que não fazem. Paulo Nobre deu a Mustafá a cadeira mais importante do COF, que, se não é a cadeira mais poderosa do mundo, também não se parece com um gesto de isolamento. "Ah, mas era preciso isso para conseguir governar". O velho argumento da meia-aposta, da escolha dos bônus sem encarar os prejuízos. Brasília anda muito bem há anos com este tipo de política. Não foi Nobre, então, quem aniquilou o poder da Abelha Rainha. Muito menos será Galiotte, que afirmou, em entrevista ao PVC, que faria o planejamento "que todo torcedor teria feito" - o que não é verdade, tampouco é sua função, e só corrobora com minha tese de que, para este presidente, basta a opinião pública gritar, querer, pedir, que ele se borra e atende, afinal, ele faz o que o torcedor faria.



Na terceira rodada do estadual, a torcida organizada cantou o nome de Cuca, o que me intrigou demais. Naquela mesma época, de carnaval, foi notícia a ajuda da Crefisa, em forma de doação, à escola de samba da Mancha Verde. E Mustafá Contursi assinou a maior aberração política do ano alviverde, dando à Leila permissão de ingressar, sem que as premissas fossem comprovadas, o conselho do clube. Mustafá, Crefisa, Mancha. Simplista dizer que são aliados e pronto. Não são exatamente. Existem contradições no caminho. Mas existe um passado recente que os liga de alguma forma, diretamente ou através de um dos elos. É natural soar estranho que, no mesmo dia, tanto a torcida, em nota oficial, quanto Mustafá, falando nos bastidores, estejam com um discurso alinhado contra o departamento de futebol. Acontece que a Crefisa tem a melhor relação possível com Mattos, a cabeça que a gilhotina quer cortar, e Mustafá, para variar, está em um jogo duplo, ou triplo, já que também goza de boa relação com Galiotte, é padrinho político da Crefisa e figura central da pressão interna contra Mattos, ou seja, justo aquele que seus apadrinhados mais confiam.



Lembram de quando a piada era que o Palmeiras tinha a situação-da-oposição-da-situação? É por aí. Na história, sobra a torcida organizada, aparentemente sem cartas para fazer, neste jogo, papel de protagonismo ou algo além de causar tremedeira no sensível e suscetível presidente Galiotte. Lançou uma nota oficial sugerindo van Persie no lugar das contratações feitas, algo que o Palaia ou qualquer diretor de futebol daqueles que todos nós, a Mancha inclusive, não temos saudades, poderia ter feito. Que cresça o volume do interesse por ser o que uma torcida organizada precisa ser: voz fiscalizadora, preocupada em discutir os rumos e as decisões do clube, algo que o conselho gestor da torcida, formado recentemente após tudo que aconteceu no começo do ano, tem, até por possuir na sua lista nomes de velha-guarda, obrigação de buscar. Dela espero também malícia política e independência na voz, mesmo que isso represente cortar algo na própria carne. Desta nota, não gostei.



Não gosto de gestão-de-cantina, mas também não fico abalado com pressão à gestão profissional. É assim que ela tem que ser tratada, mesmo. No Brasil, má fase é sinônimo de demissão, e deveria ser sinônimo de pressão, que não é, ou não deveria ser, algo negativo no mundo profissional. Tenho medo mesmo é de pasmaceira, de clube anestesiado. Em frente.

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