Contratados no meio de 2014, os quatro argentinos ainda não engrenaram no Palmeiras. Tobio e Allione alternaram entre banco e titularidade no ano passado, apesar de terem começado 2015 como titulares. Cristaldo ficou no banco de Leandro Pereira contra o Audax, enquanto Mouche operou o joelho e só volta no Brasileirão.
O que é certo é que, no Palestra Itália, apenas um hermano é incontestável. Só que ele não joga com os pés, mas sim com as mãos.
Trata-se de Maximiliano Stanic, o Maxi, armador titular da equipe de basquete do Palmeiras/Meltex, 7ª colocada do NBB. O argentino joga desde o início de 2014 pela equipe alviverde, e de cara tornou-se ídolo pelo estilo de jogo ao mesmo tempo aguerrido e cerebral.
Logo em sua estreia, ajudou o Palmeras a vencer um jogo dificílimo contra o Bauru, em 23 de janeiro do ano passado. Os times estavam empatados em 84 pontos, a segundos do fim. A posse estava com o time do interior, mas Stanic, como um louco, se atirou em cima de um adversário e conseguiu uma bola presa da arbitragem. Os alviverdes acabaram ficando com a bola, no estouro do cronômetro, Guto acertou de três para dar a vitória ao time da casa.
"O Brasil tem atletas muito habilidosos, que atleticamente estão em outro nível. Mas, no quesito raça, ninguém é igual aos argentinos", explica Maxi, ao ESPN.com.br.
O argentino tornou-se titular absoluto e, em pleno ano do centenário, conduziu o Palmeiras aos playoffs do Nacional, algo que não acontecia desde 1998. Criou enorme identificação com a torcida, que não aceitou sua saída ao final da temporada.
De volta à Argentina, passava suas férias quando chegou uma proposta do poderoso Paschoalotto/Bauru, time que hoje lidera o NBB. Três anos de contrato e quatro vezes o salário que ganhava no Palmeiras.
Aos 36 anos, não tinha como recusar essa "bolada", certo?
Mas Maxi recusou...
Tudo porque, via internet, os torcedores palmeirenses começaram a campanha #FicaMaxi, que pedia a volta do ídolo argentino. Stanic ficou comovido, e voltou ao Palestra Itália para ganhar ainda mais moral com os torcedores alviverdes.
"Jogando aqui em casa, dificilmente alguém ganha da gente. Essa torcida louca faz a diferença. Quando não estamos bem, eles começam a cantar gritar, e nos colocam novamente no jogo. Aqui, redescobri a alegria de jogar basquete", exaltou o gringo, que cogita até mesmo desfilar pela "Mancha Alviverde" no carnaval deste ano.
Os números mostram que Maxi realmente reencontrou a alegria. Com 6.17 assistências por jogo, ele é o vice-líder do quesito do NBB, atrás apenas de Gustavinho (7.00 por jogo) - a diferença é que o argentino fez 18 jogo, contra apenas um do atleta do Mogi. O palmeirense fica à frente até de estrelas como Nezinho, do Limeira, e Laprovittola, do Flamengo.
Além disso, o hermano faz 9.67 pontos por jogo, mesmo confessando que não gosta de chutar: "Sou um armador puro. Penso primeiro no time, depois em fazer a cesta".
Na entrevista, Stanic também falou de sua paixão pelo futebol (e pelo Boca Juniors), a admiração pelo armador Steve Nash, a vida em São Paulo e os planos para o futuro. Segundo ele, a mulher, Carina, e os três filhos (Olívia, de seis anos, e os gêmeos Benjamín e Bautista, de três) hoje são sua prioridade, o que pode indicar que a aposentadoria das quadras está próxima de acontecer.
Será que vai ter um "Fica, Maxi", parte 2?
Confira a entrevista completa com Maxi Stanic:
ESPN: Como foi sua carreira até chegar ao Palmeiras?
Maxi Stanic: Comecei no clube da minha cidade, o Defensores de Hurlingham, onde morei a vida toda. Depois, fui para o Club Morón, pelo qual joguei dos nove aos 17 anos. Aos 18, virei profissional pelo Pico Fútbol Club. Passei pelo Regatas San Nicolás e depois joguei no Boca Juniors entre 2001 e 2002. Aí começou minha aventura na Europa. Foram cinco anos na Itália, depois França, voltei pra Itália, depois Espanha... Aí tive propostas pra ficar mais tempo na Europa, mas estava cansado, tenho três filhos e quis voltar pra Argentina. Voltei ao Boca e passei pelo Obras Sanitárias. Estava no obras quando o Palmeiras me procurou.
ESPN: E como foi que o Palmeiras te achou?
MS: O Betão [ex-técnico do clube; o atual é Régis Marrelli] precisava de um armador e alguém falou meu nome. Ele queria alguém com as minhas características, mas falaram que eu estava velho, tinha 35 já. Aí ele começou a ligar para a Argentina e ouviu que eu estava bem, jogando normal, que tinha 35 mas estava bem. Quando me ligaram, resolvi tudo rápido, não pensei duas vezes em aceitar.

Maxi vibra durante jogo do Palmeiras
ESPN: E qual foi sua primeira impressão quando chegou ao Palestra Itália?
MS: Foi estranho, porque eu conhecia o Palmeiras pelo futebol, mas não conhecia nada do basquete. Mas foi muito legal, porque eu joguei no Boca antes, sou torcedor do Boca até, e chegar em um time enorme e importante, como o Palmeiras, é como jogar no Boca. É mais que um time, muito mais que isso. Jogar aqui é uma sensação que não tem como explicar.
ESPN: Você esperava virar um ídolo tão rápido, com direito a campanha na internet para você ficar?
MS: Não esperava, e nem creio que eu seja um ídolo. Sou só um jogador que as pessoas gostam, porque reconhecem meu trabalho e meu esforço dentro de quadra. Tudo foi muito rápido, nunca esperei uma situação como essa. Quando cheguei, a situação do time não era boa, estava brigando para não ser rebaixado. Hoje, estamos disputando vaga nos playoffs. Foi tudo muito rápido, mas parece que jogo aqui há muitos anos.
ESPN: E como você descreve sua relação com a torcida do Palmeiras?
MS: Apaixonante! Muito legal! Quando jogamos aqui (no ginásio do Palestra Itália), dificilmente alguém ganha da gente. Nessa quadra, só perdemos um jogo esse ano. Nossa torcida é louca, faz uma pressão incrível, e isso faz toda a diferença. Quando o time não está bem, o torcedor nos pega no colo, começa a cantar e gritar, nos tira do momento ruim, e aí viramos o jogo. Isso já aconteceu muitas vezes, principalmente ano passado. Eles nos dão uma energia sensacional. Aqui, redescobri a alegria de jogar basquete, muito disso por causa da torcida.
ESPN: O que o diferencia dos armadores brasileiros?
MS: Acho que tenho duas grandes diferenças. A primeira é o estilo de jogo. Sou um armador puro, que pensa primeiro na quadra, no time, e depois em fazer a cesta. Eu posso fazer cesta, é claro, mas a minha característica é colocar o time pra jogar um padrão, como pede o técnico. Na escola argentina e na europeia, isso é que eles gostam em um armador. Mas o que mais me diferencia dos brasileiros é que eles gostam de pontuar, ser o cestinha. Eu não. Minha escola é outra, e a diferença é muito grande.
ESPN: Então você compartilha aquele discurso do Ganso, do Valdivia, de que prefere "dar o passe ao invés de fazer o gol?"
MS: Absolutamente! Sempre preferi a assistência, a vida toda foi assim. Desde que cheguei ao Palmeiras, primeiro com Betão e agora com o Régis, sempre tive liberdade total pra executar meu jogo. Isso pra mim é o mais importante. Eles me falam: 'Você é o técnico dentro da quadra'. Eu escuto com atenção as instruções que recebo e tento executar lá dentro [aponta para a quadra].
ESPN: Você tem números muito bons esse ano...
MS: [Interrompe] A verdade é que não ligo para números. Cheguei a um momento da carreira que pouco penso nisso. Tem jogo que faço tantos pontos, dou tantas assistências, em outros não faço nada. O importante é ajudar o time, nem que seja pegando rebote ou fazendo falta. Tem dia em que o adversário está postado de certa maneira, e eu tenho que entender como atacá-lo. Não tenho que obrigatoriamente fazer ponto ou dar assistência, mas preciso comandar o time para atacar direito. Estatísticas eu nem levo em conta...
ESPN: Até onde o Palmeiras vai no NBB esse ano?
MS: Difícil falar... Porque nossa mentalidade é disputar jogo a jogo. Quando você tenta pensar muito à frente, nada dá certo. Estamos construindo um time praticamente do zero. O Palmeiras está começando a escrever uma nova história no basquete. Mas o time ainda está sendo montado, não dá pra eu te falar: 'Vamos terminar entre os quatro melhores, entre os oito melhores...'. Tem que ser jogo a jogo. Vamos acabar a primeira fase, fazer um bom playoff e não pensar em limites. Não temos teto! Tem que estar pronto pro playoff, que aí que é quando você vê quem está a fim de jogo de verdade.

Maxi: 'A verdade é que não ligo para números'
ESPN: Quem são os outros destaques do Palmeiras, na sua opinião? E do NBB?
MS: O Palmeiras tem dois caras que estão no auge: o [ala-armador] Neto e o [ala] Jhonatan. Amadureceram muito nos últimos tempos e estão num nível altíssimo agora aos 28, 29 anos. Tem o [pivô] Toyloy que é mais jovem, tem 26, e terá uma linda carreira ainda. E tem os caras mais no final da carreira, como o [ala-pivô] Diego, que assim como eu, ainda tem bola pra gastar. No resto do NBB, gosto muito do Derick, armador do Limeira. Ele joga como eu, pensa primeiro no time, depois em pontuar, e tem só 20 anos, vai crescer muito ainda. Também tem o Rafael Hettsheimeir, que é meu amigo dos tempos de Europa, o Guilherme Giovanonni, o Alex, caras de outro nível. Mas aqui tem muito moleque bom, de qualidade.
ESPN: Quem são seus ídolos no basquete?
MS: Vou te falar só dos últimos 15 anos, pra não ir mais pra trás. Acho o Alejandro Montecchia [armador que foi campeão olímpico em Atenas-2004 com a Argentina] um cara fenomenal. Só não jogou na NBA porque quis ficar na Europa, mas era impressionante. Na NBA, sou fã do Steve Nash. Fisicamente, você olha pra ele e pensa: 'Não tem mais condição de jogar'. Mas o cara está sempre dois, três segundos à frente de todo mundo, ele vê a jogada antes de acontecer. A qualidade de passe e de arremesso, além do controle do time, são as coisas que admiro nele.
ESPN: Qual a diferença do basquete europeu, no qual você jogou por tantos anos, para o brasileiro?
MS: Intensidade! O ritmo em que se joga na Europa é muito diferente daqui. Não falo só de correria. Lá, ninguém joga mais de 30 minutos. Joga 24, 25. Mas a intensidade ofensiva e defensiva é muito superior, a movimentação é muito mais rápida na Europa. Aqui, é muito mais devagar, joga-se mais com o talento. Lá, precisa do físico. É nisso que nós, sul-americanos, ainda estamos atrás dos europeus: intensidade de jogo.
ESPN: E o que precisa ser feito para fazer o basquete brasileiro voltar a ser sucesso de público?
MS: Marketing. Por que a liga espanhola melhorou tanto e virou a melhor da Europa, passando a Itália? Porque o marketing deles é muito bom! Hoje, isso é muito importante. Não tem que ter coisa boa só dentro de quadra, mas fora dela também. Você tem que dar algo a mais para o torcedor, tem que tratá-lo bem, senão ele não sai de casa. Ele não quer ver jogo, que espetáculo. por isso as pessoas enchem o ginásio para ver a NBA nos Estados Unidos. Não é só basquete, é outra coisa. Olha o Super Bowl! É um espetáculo que dão pro torcedor. Por isso tanta gente briga pra ir no jogo.
ESPN: Você acompanha a NBA?
MS: Não tanto quanto eu gostaria. Acompanho mais os argentinos, pois tenho muitos amigos que jogam lá. Sempre vejo o que fez o Pablo Prigioni, o Luis Scola... Joguei com vários deles nas seleções de base da Argentina, inclusive.
ESPN: Mudando de assunto, você disse que gosta de futebol. É fanático?
MS: Não sou um maluco, que viajava para ver todos os jogos, essas coisas, mas vou à Bombonera sempre que posso. A última Libertadores que o Boca foi à final [2012], eu fui a todos os jogos em casa até a semifinal, só não fui à final contra o Corinthians porque não estava em Buenos Aires...
[Nesse momento, um torcedor que passava ouve a resposta de Maxi e brinca: 'Então foi por culpa sua que o Corinthians ganhou!'. O argentino sorri: 'Pois é...']
... Por causa do basquete, não tenho tempo de ver muito futebol, mas gosto muito de assistir. Fui a vários jogos do palmeiras no Pacaembu, fui à estreia do Allianz Parque, e agora no Paulistão devo ir a vários jogos.
ESPN: Se você torce para o Boca, quer dizer que tem boas lembranças do Palmeiras, não é?
MS: Sim, sim, no futebol são ótimas lembranças (risos)! Lembro daquela Libertadores de 2000. Quando empatamos por 2 a 2 na Bombonera, ninguém acreditava que conseguiríamos ganhar aqui. Mas, no Morumbi, anularam um gol legal do Palmeiras, seguramos o 0 a 0 e ganhamos nos pênaltis. Lembro como se fosse hoje!
ESPN: E você, assim como os torcedores palmeirenses, está empolgado com o time desse ano?
MS: Vou ser sincero: não conheço muitos dos contratados. Mas conheço bem o Zé Roberto, é um cara respeitado pelos argentinos. Mas todos me dizem que montamos um grande time esse ano. O Palmeiras tem que ser protagonista sempre. É um time gigante, que, quando entra em um campeonato, seja o Paulista ou o Brasileiro, tem que ser protagonista. O torcedor espera e cobra isso. Teve anos ruins, isso é fato, mas tem que esquecer, o que passou, passou. Aqui é igual ao Boca: se fica dois anos sem ganhar um título, a torcida fica louca, porque está acostumada a ser campeã.
ESPN: Você conhece os quatro argentinos do time de futebol?
MS: Não conheço pessoalmente, só de nome. Já vi em campo, mas nunca conversei.
ESPN: Que conselhos você daria a eles para terem o mesmo sucesso que você?
MS: Sei o que eles estão passando, porque já aconteceu comigo. Para mim, foi muito fácil me adaptar ao Brasil, porque já joguei em muitos países. Aqui é o quarto país estrangeiro que moro! Quando você está há muitos anos fora de casa, é mais fácil se adaptar a um novo país. Acho que eles não passaram muito tempo fora, e precisam de um tempo para se adaptarem aqui. É tempo, só isso que precisam. E precisam ter a cabeça focada para, quando chegar o momento, aproveitar.

Maxi não conheçe os gringos do futebol
ESPN: Hoje, muitos times no Brasil, tanto no futebol quanto no basquete, tem jogadores argentinos. Por que acha que os brasileiros gostam tanto dos argentinos?
MS: Um híbrido de um jogador brasileiro com um argentino seria o melhor jogador do mundo... O brasileiro é mais atlético, mais talentoso, mais habilidoso. O argentino é mais racional e tem mais raça, porque sabe que não tem condição de igualar a habilidade e o físico do brasileiro. Por isso, brasileiros e argentinos se entrosam tão bem quando jogam juntos. Aqui, no Brasil, há jogadores muito habilidosos, que estão atleticamente em outro nível, mas, mentalmente e na questão da raça, não existe ninguém igual aos argentinos. Justamente porque não temos o talento e o nível atlético dos brasileiros! Para competir, para igualar, temos que usar outras armas. E nossa arma principal está aqui [aponta para a cabeça]. É no psicológico que muitas vezes vencemos os brasileiros. E da mesma forma que os brasileiros gostam da gente, os argentinos gostam dos brasileiros. Quem não gosta de Ronaldinho, Rivaldo, Ronaldo, Neymar?
ESPN: Gosta de morar em São Paulo?
MS: Muito! Vivi em Buenos Aires, adoro quilombo, barulho, bagunça! Lá na Argentina, se quero ir a algum lugar, também demora 40 minutos, uma hora, igual aqui. Mas gosto de cidade grande, onde tem coisas pra fazer, não gosto de ficar entediado. Na folga, vou ao Sesc, brinco com os meninos no parque Villa-Lobos ou aqui no parquinho do Palmeiras, sempre tem o que fazer.
ESPN: E o futuro? Até quando vai seu contrato com o Palmeiras?
MS: Tenho contrato até maio... Depois, não sei... A verdade é que muito difícil eu não voltar pra Argentina. Esse deve ser meu último ano no estrangeiro. Não sei se vou aposentar, se vou continuar jogando... Quando acabar a temporada, vou voltar pra Argentina e tomar a decisão. Agora, minha prioridade é a família. O basquete não é mais a primeira opção, é a família. O esporte sempre foi a prioridade, dediquei muitos anos a isso. Vou tomar uma decisão, mas só depois de ouvir todos da família...

Maxi Stanic: vice-líder de assistências de todo o NBB
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