Foi uma semana estranha.
Nesta terça, dia 4, Leandro, atacante, e Valdivia, ator, falaram à imprensa. O primeiro, entrevistado por um jornal, criticou o departamento médico do clube. Já o chinelo (maldito corretor, sempre tão correto) foi o Bola da Vez da semana, aqui na casa, e bateu forte na diretoria palmeirense, tal qual já fizera noutra entrevista dias atrás a um site.
Esta é a hora que o periquitão que vos fala se protege dos patrulheiros que vão enxergar violência no que direi, como se fosse, ela, invenção minha. Mas vamos lá: quando, 20 anos atrás, estes dois, digamos assim, atletas, teriam coragem de falar o que falaram, sem mais nem menos? O que virou o futebol, senão um teatro com plateia acrítica, inerte, que aceita tudo? Em qual grau chegou a cara de pau dos jogadores de futebol?
Não existe vestígio de gratidão que os faça ter senso do ridículo, nem qualquer sentimento espontâneo de consideração pela própria imagem, exposta justamente ao ridículo nos dois casos. Se julgam no direito de bater no peito, reivindicar atenção e, quem sabe, até um pedido de perdão de nós, detratores negativos ao futebol. Acham que o dinheiro, ganho em dia, compra a saída pela porta da frente. Antes fosse. Basta um microfone, uma câmera, e eles conseguem esta saída: muita gente se convence com três ou quatro abobrinhas dissimuladas.
Me chama a atenção em particular o esforço em sair pela porta da frente. Como se isso importasse algo para eles. Como se houvesse conexão com valores do mundo real do futebol.
Eles
Leandro não deveria ter vindo. O Grêmio fez de tudo para livrar-se da fera. Foi a famosa troca cinco-por-um, primeiro gesto contundente da gestão Nobre (o assassino do basquete palmeirense) e Brunoro na "gestão" do clube. Tão lúcido quanto a dupla, Felipão chegou a convocar Leandro para a seleção, em amistoso na Bolívia. Valdivia, entre o Mundo Árabe e a Disney, assombra o ego palmeirense há quase uma década. Juntos de Wesley, formam o triunvirato fundamental, a tríade que traduz tudo que o futebol não precisa e o Palmeiras não merece.
Mas eles deram as entrevistas, esculacharam profissionais do Palmeiras, bateram nos diretores como se fossem de outra turma, e está tudo bem nesta sexta-feira. São blindados, os jogadores de futebol de hoje. Tanto dinheiro os torna insensíveis e invisíveis ao mundo real. A gente nota isto, por exemplo, quando Leandro está em campo. No supermercado, na calçada, no trânsito, ninguém os vê, e se vê, pipoca, não cobra, talvez concorde com o que ouviu na tevê e peça até uma selfie.
Que soe antipático aos que absorveram aquela baboseira de que futebol é entretenimento: jogador tem que temer o que fala, e tem que ralar muito, ganhar muito jogo cascudo, antes de sequer pensar em falar grosso contra o clube. Os pequenos são eles no processo. Grande é o clube com sua gente e seus anos, e a troca é justa, estes caras ganham um dinheiro incontável em troca de umas dores nos tendões após a aposentadoria antes dos 40, mas sobretudo em troca de bancar um tipo, o tipo torcedor, o cara que cobra representatividade, paixão e fibra no nosso caso, um quê maloqueiro e sofredor no slogan do rival, estas coisas que não podem tirar da gente.
Mas os clubes vendem o que não tem para dar a eles mais dinheiro do que valem. É óbvio que eles ficam confusos e se acham maiores que o clube.
Amanhã tem jogo
Nestes tempos de Neymar por todo lado e torcedores brasileiros do Barcelona, o processo se inverteu, e é a gente que tem de engolir desaforo de quem não é nada para o clube, assim como engole numa boa o estádio fechado para um torneio de video-game, estas loucuras que ninguém mais questiona. De novo: ninguém mais questiona, e Twitter não representa questionamento de nada.
É a velha história do "Amanhã tem jogo, hein" em vez do "Jogou muito ontem, hein". Qual das duas coisas você fala para jogador de futebol? Desde quando merecem mimo? O resultado está aí: mijam na sua pia, chutam seu cachorro, assaltam sua geladeira e ainda tiram onda quando vão embora da sua casa. E amanhã estarão num periscope da vida sendo elogiados por alguma coisa qualquer. Falta um peão pouco encarável e nada humorado, sem Twitter nem Facebook, para falar umas verdades, explicar umas coisas, cobrar o respeito que pelo jeito ninguém mais quer preservar, muito menos impor.
Nesta semana, Leandro e Valdívia empurraram um pouco mais para perto de nós a grade da inércia. Estamos cada vez mais domesticados, eles cada vez mais ricos e folgados, tudo é ponderado pelos 38 mil programas de conversa esportiva e o torcedor não consegue mais levar nada para o pessoal. Ao contrário, tudo é impessoal. Nestes pequenos retratos (e pequenas cadeiras) está visível o tamanho da distância que os clubes, hoje, tomam de sua gente.
Substituição no departamento médico
Saem Valdívia e Leandro, estas duas figuras deprimentes, e entra Gabriel, a melhor coisa que vi neste estádio novo. Que ele limpe, nestes seis meses, o baixo-astral do departamento médico.
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