O técnico Ricardo Gareca comanda um elenco multinacional no Palmeiras, com representantes de Argentina, Uruguai, Chile e Paraguai. Morador das dependências do clube há mais de 40 anos, o torcedor boliviano Jesus Mino, querido pelos ídolos da Academia, aumenta a trupe sul-americana.
Nascido na Bolívia, Jesus é um personagem folclórico dentro do Palmeiras. Ele começou como engraxate no clube, virou torcedor e, não se sabe exatamente de que maneira, passou a viver nas dependências da instituição. Com a reforma do estádio, foi deslocado para um quarto de uma das casas mantidas pela agremiação na Rua Padre Antônio Tomás.
Há uma espécie de lenda em torno da figura do torcedor. César Maluco conta que Jesus veio junto com a delegação de uma excursão para a Bolívia e simplesmente nunca mais retornou ao país de origem, algo que teria acontecido antes da chegada do atacante ao Palmeiras, em 1967.
“É difícil um clube ter Jesus, não é mesmo? O Palmeiras tem o seu. Esse, é abençoado. Eu gosto de conversar com Jesus. É uma pessoa humilde e fez a vida trabalhando como engraxate. Com a construção da arena, ficou mais difícil para ele trabalhar no clube. Temos que arrumar um lugarzinho para o Jesus”, disse César.
Aos 75 anos, o boliviano tem certa dificuldade para se expressar e não costuma dar trela a desconhecidos. Acompanhado pelo amigo Bruno Alexandre Elias, funcionário do Departamento de Acervo e Memória Histórica do Palmeiras, ele aceitou visitar as obras do antigo estádio Palestra Itália junto com a Gazeta Esportiva.
Jesus não gostou muito de usar botas e capacete, mas aprovou o passeio pelas dependências da moderna arena, com 95% das obras já concluídas, de acordo com a construtora WTorre. Ele aproveitou a chance de se aproximar do gramado e até experimentou uma das cadeiras do anel superior.
Morador do Palmeiras desde os anos 1970, Jesus Mino não perdeu a chance de se aproximar do gramado
“Eu gostei do estádio, está ficando bonito. Tem algumas pessoas que não gostaram, mas eu gostei”, disse Jesus. O boliviano, com ar desconfiado diante das perguntas da reportagem, respondeu sempre com frases curtas, mas desmentiu a história de César Maluco: “Ele é um piadista”.
Jesus parece não gostar de falar sobre o passado, mas garante ter imigrado por conta própria. Depois de morar no Mato Grosso, estado fronteiriço com a Bolívia, veio a São Paulo e passou a trabalhar como engraxate no Palmeiras por indicação de alguém da Paróquia São Geraldo das Perdizes, no Largo Padre Péricles, próximo ao clube.
Os principais historiadores palmeirenses não sabem detalhes sobre a trajetória de Jesus Mino. Um deles acredita que ele frequente o clube há mais tempo, mas é fato que o boliviano está na instituição, pelo menos, desde os anos 1970, já que Leivinha (1971-1975) fala com carinho sobre o personagem.
“Eu joguei só cinco temporadas pelo Palmeiras, mas ele mora no clube faz muitos anos. Há quanto tempo não está vivendo os bastidores do Palmeiras? Desde a minha época. Não podemos esquecer esse tipo de gente que fez parte da nossa convivência. Sempre que nos encontramos, conversamos sobre futebol”, disse Leivinha.
Querido pelos ídolos da Academia de Futebol, Jesus Mino entrou no Palmeiras trabalhando como engraxate
Conhecido pelos sócios e funcionários do Palmeiras, Jesus vive graças à solidariedade alheia. No caminho do estádio até o quarto que ocupa, foi avisado por uma senhora que havia sobrado um prato de risoto da aula de culinária encerrada há pouco no clube. Ele costuma ganhar roupas e calçados dos amigos.
“A minha família não liga mais para mim. Já me esqueceram há muito tempo”, diz Jesus Mino, que nunca chegou a retornar à Bolívia. Embora dependa da boa vontade dos conhecidos para viver, o torcedor de 75 anos não costuma pedir nada, contam seus amigos.
“Ele é mais aberto com quem já tem certa intimidade”, explica Bruno Alexandre Elias. Ainda assim, o boliviano evita recordar o próprio passado. “É difícil precisar de que maneira os caminhos do Jesus e do clube se cruzaram, já que ele fala pouco sobre isso. Provavelmente, é mais uma questão que ficará como uma interrogação”, acrescentou.
Diante das obras da arena, que deve receber uma exibição dos Rolling Stones em breve, Jesus lembrou que costumava entrar como penetra nas apresentações de bandas realizadas no antigo Palestra Itália. Durante todo o percurso, ele não se desgrudou do livro Meu Pequeno Palmeirense, direcionado ao público infantil. Quando deixa o clube, costuma ir ao cinema.
Fã de jogadores como Ademir da Guia, Tupãzinho e Servílio, o boliviano parece não se empolgar com o futebol moderno. “Aparentemente, abandonou um pouco, mas de vez em quando flagramos o Jesus acompanhando as partidas pela televisão. Ele segue mais os jogos do time de basquete disputados aqui no clube”, conta Bruno.
Embora a empolgação com a equipe de futebol tenha diminuído nos últimos anos, Jesus sabe a atual situação do camisa 10. “O Valdivia joga bem, mas se machuca a toda hora”, observou o torcedor, colocando a mão na coxa, como fez o chileno no último final de semana.
Com as obras 95% concluídas, o estádio do Palmeiras deve ser reaberto ainda no ano de 2014. Dentro do clube, já existe um clima de preocupação com a possibilidade de Jesus Mino ficar desalojado em consequência da demolição do imóvel que atualmente ocupa.
O boliviano experimentou uma das cadeiras
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