Evair ficou marcado na história do Palmeiras ao comemorar de braços abertos seus dois gols contra o Corinthians, na goleada por 4 a 0 que garantiu o título paulista de 1993, e o fim da fila de quase 17 anos do clube.
Até chegar àquele 12 de junho, porém, o atacante sofreu. Passou por críticas e um afastamento em 1992 para encerrar a sina do clube de “sepultar atacantes”, conforme avisou seu tio, Eliseu, palmeirense.
– Fui visitar meu tio palmeirense no bar dele em Ouro Fino (MG) depois de eu ser contratado. Lá de dentro ele gritou: “Tanto time para ir e você vai logo para o Palmeiras, que enterra seus atacantes”. Aquilo já me deu ideia de como seria – contou o ex-jogador, de 49 anos, ao L!Net.
Realmente, não foi fácil. Contratado em 1991 após jogar pela Atalanta (ITA), ele conviveu com a pressão da torcida para que o time voltasse a levantar uma taça, algo que não acontecia desde 1976, e até dúvidas em relação à sua condição física.
– Quando saí do Guarani, tinha hérnia de disco. Fiquei três anos na Atalanta, mas parece que não vivi aqueles três anos quando cheguei, já houve aquela polêmica – recordou.
Em 1992, participou da campanha que rendeu o vice-campeonato do Paulista. Pouco depois, porém, foi afastado pelo técnico Nelsinho Baptista, junto de Ivan, Andrei e Jorginho, sob a alegação de deficiência técnica. Foram cinco meses fora.
– Marcou muito para mim ter que ir pegar minhas coisas dentro de um saco de lixo e ir para casa. Tudo aquilo ficou muito na minha mente. Passei algum tempo remoendo aquilo, querendo dar a volta por cima.
Seu retorno se deu com a troca de comando técnico, quando Otacílio Gonçalves assumiu. Em 1993, tornou-se uma das principais referências no Palmeiras recheado de estrelas, que voltou a ganhar títulos. O Estadual daquele ano encerrou com a angústia da torcida palmeirense.
– Quando jogávamos no Palestra Itália, o ônibus parava e a gente tinha que atravessar debaixo do torcedor. Ali já começavam a gritar. No jogo, passava 15, 20 minutos e já começavam as vaias. Era aquela coisa de que precisava de resultado – contou.
Evair com a bola autografada pelo elenco da Libertadores-99 (Foto: Eduardo Viana/LANCE!Press)
Até 1994, o Matador ganhou mais um Estadual, um Rio-São Paulo, e dois Brasileiros. Foi para o Japão, rodou por outros clubes do Brasil, até voltar para conquistar o principal título da década: a Libertadores.
Em 1999, Evair já não era o titular absoluto do ataque como na época de Vanderlei Luxemburgo, mas teve sua importância durante a campanha no torneio internacional, com Luiz Felipe Scolari no comando.
Na decisão, contra o Deportivo Cáli (COL), abriu o placar de pênalti, mas acabou expulso e não pôde participar da disputa de penalidades no Palestra Itália. Restou apenas rezar no vestiário ao lado de um padre.
– Aquele título, por ser dentro do Palestra Itália, ficou muito mais gostoso. Eu estava no banco, entrei, bati o pênalti e logo depois fui expulso. Lembro de estar ajoelhado no vestiário, de um lado da maca, e do outro o padre. Nós estávamos desesperados. Quando tinha aquele grito, a gente sentia, gol do Palmeiras. Até o último erro (do Zapata), quando parecia que o estádio viria abaixo. Alguém desceu e avisou: “pode comemorar, é campeão”. Seria bem melhor se tivesse batido um pênalti – afirmou.
É desta conquista que Evair tem uma das maiores relíquias da carreira: a bola da final. À época, o atacante pegou autógrafos de todo o elenco, e até da diretoria, e guarda até hoje o objeto, muito desgastado pelo tempo, em sua casa em São Paulo.
Evair ficou para disputar o Mundial no fim do ano. A derrota para o Manchester United (ING), por 1 a 0, no Japão, foi seu último jogo com a camisa alviverde, e aquele que “atrapalhou” o fim perfeito de sua história como jogador no Palmeiras.
– Faltou ser campeão do mundo. Faltou aquele titulo contra o Manchester. Aquele ali eu poderia dizer “posso ir embora, posso ir para casa, posso me aposentar ali mesmo”. Mesmo assim sou muito grato a Deus e ao Palmeiras por tudo que vivi ali dentro – explicou o ex-jogador.
Já são quase 15 anos desde o último dos 245 jogos que fez com a camisa palmeirense, e pela qual marcou 127 vezes. O carinho da torcida por Evair, contudo, permanece intacto.
(Evair recebeu o L!Net em sua casa na capital paulista - Foto: Eduardo Viana)
O ponto alto desta relação, a final de 1993, tem um valor especial para Evair ao ouvir a narração do ex-locutor esportivo Fiori Giglioti de seu primeiro gol nos 4 a 0 sobre o Corinthians:
“o moço de Crisólia, uma cidade pequena do interior mineiro fazendo festa pelo gol que o seu filho faz”.
Não só a terra natal do camisa 9 festejou, mas também milhões de palmeirenses que não sabiam o que era gritar “campeão” há tempos.
O ex-atacante conta que o que mais ouve nas ruas ainda hoje é a palavra “obrigado”. Uma bela história, que precisou passar por mais altos do que baixos para ser escrita assim. E que deixou o seu tio orgulhoso.
– Ele não acreditava, ele achava que não era possível um cara sair de Crisólia, um cara desse aqui se tornar isso. Para ele era inacreditável. Então, destes 100 anos de Palmeiras, esta é a minha grande história. Para mim, a mais marcante – encerrou.
BATE-BOLA: EVAIR
‘Foi bom demais ver o palmeirense com orgulho de vestir a camisa’
O que representa o centenário?
Representa uma historia que a gente teve a oportunidade de viver junto com o Palmeiras alguns anos. Uma tradição muito grande. Uma história de um time que passou e passa por altos e baixos e tem uma paixão muito grande. Tenho o maior orgulho em ter contribuído por alguns anos ali dentro.
Por que você é tão querido até hoje pela torcida do Palmeiras?
O palmeirense teve muita paciência comigo, ainda mais por jogar em um grande rival do Palmeiras (jogou no São Paulo em 2000). Talvez seja porque eles me viram passar a dificuldade diante de um grupo e voltar, acho que viram a entrega que tive na época da fila, depois dos titulos.
Já pensou o que teria sido de sua carreira se tivesse saído do Palmeiras quando foi afastado?
Com certeza teria feito história em outro lugar. Com o Palmeiras com certeza foi mais grandioso, mais glorioso. Porque era uma época em que a cobrança era tão grande que a gente não tinha sossego para ir no cinema, ao mercado com a família.
Depois de toda esta cobrança, o que significou acabar com a fila?
Quando veio o primeiro título foi um sabor gostoso, foi bom demais ver o palmeirense com orgulho de vestir a camisa. Acabamos esquecendo todas as amarguras que ficaram, todas as diferenças que tínhamos para poder gozar daquela conquista.
Você trabalhou com Luxemburgo e Felipão, dois dos maiores técnicos do Palmeiras. Tem preferência por algum dos dois?
Sempre disse que o Luxemburgo foi inovador. O Felipão é o cara que consegue fazer com que o time se torne um grupo. Um era mais estudioso, outro mais motivador. Não dá para mensurar, os dois são bons.
SENTIMENTO EM VERDE E BRANCO, por Evair:
O Palmeiras para mim é...
"É uma paixão marcada para sempre."
A minha maior alegria pelo Palmeiras foi...
"São tantas. Desde o meu tio que eu contei, vivo até hoje, o título de 1993, é uma das maiores alegrias que eu pude viver."
A minha maior tristeza pelo Palmeiras foi...
"Foram várias também. O afastamento, o titulo perdido em 92, aquela sensação de vazio, as cirurgias..."
A torcida do Palmeiras para mim é...
"Não tem como definir, algo sem preço. Recebo homenagens sempre que saio de casa. O que mais ouço é: “obrigado”.
O meu jogo inesquecível no Palmeiras é...
"Sem dúvidas, a final do Paulista de 1993. Aquele é o meu cartão de visitas."
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