Ao longo de um século de clube, apenas três jogadores foram homenageados com bustos pelo Palmeiras – os ex-goleiros Marcos e Oberdan Cattani ganharão a honraria em breve. A história das estátuas é cercada por lendas, mágoa e uma curiosa falha justamente na peça dedicada a Ademir da Guia, o maior ídolo da história.
Juntos, Waldemar Fiúme e José Junqueira, primeiros a ganharem bustos nas alamedas do clube, viveram a transição de Palestra Itália para Palmeiras, conquistando o Campeonato Paulista de 1942 sobre o São Paulo. O primeiro disputou 601 jogos de 1941 a 1958 e o segundo, 326 de 1931 a 1945.
Recordista de títulos paulistas pelo Palmeiras (sete), Junqueira teve seu busto inaugurado em 1945. Já Waldemar Fiúme, ganhador da Copa Rio de 1951, torneio com status de Mundial, recebeu a homenagem em 1958. Os torcedores precisariam esperar quase 30 anos para ver um ídolo ganhar a mesma honraria.
Ademir da Guia encerrou a carreira em 1977 e fez um jogo de despedida em 1984, mas teve seu busto inaugurado apenas em 1986. Cobrado pela torcida desde que o Divino se aposentou, o clube marcou a cerimônia de inauguração da peça para o dia 31 de agosto e convidou ídolos como Romeiro, Julinho Botelho e César Maluco.
Acompanhado pelo pai Domingos da Guia, considerado um dos melhores zagueiros da história do futebol, Ademir aguardava pela homenagem. No momento em que o pano que cobria a obra foi retirado, o clima de decepção tomou conta, já que a estátua simplesmente não lembrava o Divino.
“Ademir da Guia, sempre tímido e acompanhado pelo pai, ficou surpreso quando viu o busto erigido no Parque Antárctica. Não que ele já descartasse qualquer possibilidade de ser homenageado pelos palmeirenses, mas sim por causa dos traços que tinha seu rosto. Parecia-se com todo o mundo, menos com ele”, noticiou A Gazeta Esportiva.
Enquanto o primeiro busto de Ademir da Guia (e) não foi substituído, o Palmeiras permaneceu em jejum.Bruno Ceccon/Gazeta Press
O próprio Ademir da Guia, constrangido, não se identificou com a estátua. “Acho que não parece muito comigo. Talvez tenham tentando me retratar aos 22 anos. Se eu achar que realmente não ficou parecido, vou pedir para o presidente fazer outro busto”, afirmou o Divino, 901 jogos, 153 gols e 11 títulos de 1961 a 1977.
Horas depois da malsucedida inauguração do busto, Ademir da Guia acompanhou o empate sem gols entre Palmeiras e Inter de Limeira no primeiro jogo da final do Campeonato Paulista de 1986, testemunhado por 104.136 pagantes no Morumbi. No dia 3 de setembro, o time paulistano perdeu por 2 a 1 a finalíssima e permaneceu na fila.
Durante o longo período de jejum, iniciado após o título paulista de 1976, o último com a presença de Ademir da Guia, surgiram várias lendas para explicar a escassez de troféus. Uma das teses garantia que o Palmeiras não seria campeão enquanto o Divino não fosse homenageado de forma justa.
Em 19 de dezembro de 1992, em uma cerimônia mais simples, o então presidente Carlos Bernardo Facchina Nunes e Ademir da Guia inauguraram uma nova versão do busto, que permanece no clube até hoje. No dia seguinte, o Palmeiras perdeu o título paulista para o São Paulo, mas finalmente saiu da fila em 1993.
Os bustos de Waldemar Fiúme, Junqueira e Ademir da Guia estão expostos nas dependências do Palmeiras
Enquanto Ademir da Guia inaugurava a segunda versão de seu busto nas alamedas do Palestra Itália, o ex-goleiro Oberdan Cattani, atleta do Palmeiras de 1941 a 1954 e ex-companheiro de Junqueira e Waldemar Fiúme, continuava à espera da sonhada homenagem.
Ao longo dos anos, criou-se a lenda de que, para ser homenageado com um busto, o jogador não poderia ter enfrentado o Palmeiras durante toda sua carreira. No entanto, não há menção alguma ao assunto no estatuto do clube, tanto que Ademir da Guia já jogou um amistoso contra o time em 1960, pelo Bangu, no Estádio do Pacaembu.
“Ademir da Guia, que apareceu quando a peleja estava quase no fim, aos 32 minutos da 2ª fase, não teve tempo para brilhar. O marcador já assinalava 3 a 0 para o Palmeiras e o jogo estava definido. Em todo caso, revelou qualidades. Os demais não passaram de regulares”, noticiou A Gazeta Esportiva sobre o jogador de 18 anos.
Oberdan Cattani disputou 351 partidas pelo clube, mas encerrou a carreira no Juventus e chegou a enfrentar o Palmeiras, o que acabou usado como justificativa para evitar a construção de uma estátua dedicada a ele, embora fosse conselheiro vitalício do clube.
Ídolo Oberdan morreu antes da homenagem.Fernando Dantas/Gazeta Press
Campeão paulista de 1942 e da Copa Rio de 1951, Oberdan nunca admitiu com todas as letras, mas tinha profunda mágoa por não contar com um busto no clube – questionado sobre o assunto, costumava citar a escultura de suas mãos em bronze que ficava na antiga sala de troféus.
Quando o clube confirmou a construção de um busto para o ex-goleiro Marcos, com quem Oberdan tem relações cortadas, a insatisfação aumentou. No ano passado, no entanto, o Palmeiras, presidido por Paulo Nobre, finalmente aprovou a homenagem ao veterano, que faleceu antes de recebê-la.
Ademir da Guia, Junqueira, Waldemar Fiúme, Marcos e Oberdan Cattani disputaram centenas de jogos pelo Palestra Itália-Palmeiras, conquistaram títulos importantes e, acima de tudo, foram ídolos da torcida. Em tempos de futebol moderno, é difícil acreditar na possibilidade de o seleto grupo ganhar novos integrantes.
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