Paulo César de Araújo, autor de Roberto Carlos em Detalhes, hoje leciona na rede pública e na PUC do RJ
O livro “Roberto Carlos em Detalhes”, alvo de uma intensa briga judicial, aborda também a relação do cantor com o futebol. Segundo Paulo César de Araújo, autor da biografia proibida em 2007, o artista, vascaíno de coração, foi atraído ao Palmeiras por sua primeira mulher, Cleonice Rossi.
A obra relata que o primeiro time preferido de Roberto Carlos foi o Flamengo. Em seguida, ele teve um flerte com o Botafogo, mas aos oito anos (1949) decidiu torcer pelo Vasco definitivamente. Na época, as rádios de Cachoeiro do Itapemirim-ES, terra natal do cantor, transmitiam os jogos dos times do Rio de Janeiro, então capital federal.
A escolha de Roberto Carlos pelo Vasco coincide com o sucesso do “Expresso da Vitória”, time que marcou época entre as décadas de 1940 e 1950. A equipe cruz-maltina forneceu oito jogadores para a Seleção Brasileira na Copa do Mundo 1950, entre eles Barbosa, Danilo e Ademir de Menezes.
“O Expresso da Vitória estava ganhando tudo naquele período e acabou fazendo vários vascaínos por todo o Brasil, inclusive o Roberto Carlos. Ele ainda era neto de um imigrante de Portugal, país historicamente ligado ao clube”, explicou o historiador e jornalista Paulo César de Araújo à Gazeta Esportiva.
Roberto Carlos passou a simpatizar com o Palmeiras nos anos 1960. Segundo o biógrafo, ele foi atraído ao clube por sua primeira esposa, Cleonice Rossi Martinelli, descendente de italianos. Na época, brilhava a Academia de Futebol, liderada por Ademir da Guia.
“A questão do Roberto Carlos com o Palmeiras é da época da Jovem Guarda e foi influência da Nice, com quem ele se casou e teve dois filhos. O Roberto tinha acabado de chegar a São Paulo e adotou o Palmeiras como o seu segundo time”, contou Araújo.
Inspiradora da música “Como é grande o meu amor por você”, um dos maiores sucessos de Roberto Carlos, Nice conheceu o cantor em 1966 e foi casada com ele até 1978. Neste período, o Palmeiras ganhou quatro títulos paulistas (1966, 1972, 1974 e 1976) e cinco nacionais (dois em 1967, 1969, 1972 e 1973).
Nice e Roberto: ela morreu de câncer em 1990
A vitória de Roberto Carlos na edição de 1968 do prestigiado Festival de San Remo, realizado na Itália, teve ares de conquista esportiva, conta Paulo César de Araújo. Na época, o regime militar, instaurado em 1964, estava ávido por um grande feito, já que a Seleção fracassou na Copa do Mundo 1966 e a delegação brasileira ganhou apenas um bronze nas Olimpíadas 1964.
“O governo militar brasileiro, como todas as ditaduras, esperava alguma conquista para explorar de maneira ufanista. O triunfo do Roberto Carlos em San Remo no ano de 1968 encobriu a ausência de vitórias no esporte de 1964 até então. Foi um dos primeiros eventos usados em grande escala pelo regime”, declarou o escritor.
Diferentemente do parceiro Erasmo Carlos, vascaíno fanático e que chegou a fazer um teste para jogar nas categorias de base do América-RJ, Roberto Carlos não é um grande fã de futebol. Ainda assim, paródias de suas canções são entoadas pelos torcedores nos estádios.
Inspirados pelos versos de “Amigo”, os corintianos pedem: “não para, não para, não para” – a canção também acabou parodiada por torcidas argentinas. Curiosamente, o artista atuou na festa oficial do centenário do Corinthians (2010) e a música “O Portão” foi tocada quando o time voltou para ficar na Primeira Divisão, em 2008. Dudu Braga, filho do astro com Nice Rossi, é corintiano fanático.
“É surpreendente que um cantor romântico tenha suas músicas cantadas em um estádio. Se alguém puxa a melodia na arquibancada, todo o mundo já reconhece. A força do repertório dele permite isso. Na Argentina, ele é um ídolo. O Maradona, por exemplo, casou ao som de Roberto Carlos. Nos anos 1970, ninguém vendia mais discos no país”, contou o biógrafo.
O livro Roberto Carlos em Detalhes, editado pela Planeta, foi lançado em 2006 e recolhido das livrarias no ano seguinte. Insatisfeito com a biografia, o cantor entrou na Justiça para embargar a obra, o que ocorreu mediante acordo firmado entre as partes.
Apesar da proibição, é fácil baixar a obra na Internet e uma livraria em Portugal segue vendendo a biografia censurada por Roberto Carlos. No ano passado, Paulo César de Araújo lançou “O Réu e o Rei”, pela Companhia das Letras, livro que conta minúcias da batalha jurídica.
Otimista, o escritor espera que uma mudança na legislação brasileira permita a livre publicação da biografia, resultado de 15 anos de pesquisa e mais de 150 entrevistas. Em 2013, o grupo “Procure Saber”, com Caetano Veloso, Chico Buarque e Gilberto Gil, além do próprio Roberto Carlos, defendeu a manutenção da lei.
“O Procure Saber por enquanto é vitorioso, porque ainda não houve mudança na lei. Mas várias biografias que estavam proibidas, com os recursos, foram sendo liberadas. A única proibida hoje no Brasil hoje é Roberto Carlos em Detalhes.
Mesmo assim, o livro continua sendo lido e por isso não me sinto derrotado. Sigo na expectativa pela alteração na legislação. Quando liberar, vou cantar: ‘Eu voltei, agora pra ficar’”, avisou o autor.
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